Nada
melhor que comemorar nosso dia da mulher com um dos livros pioneiros no quesito
Literatura Feminista. Charlotte Perkins tinha 32 anos quando
publicou O papel de parede amarelo,
no ano de 1892. Ela lutou até o ano de 1935 a favor dos direitos para as
mulheres e só parou com sua morte. Até os anos 70, seu conto foi esquecido,
sendo apenas redescoberto pelo movimento feminista e utilizado como se fosse
uma Bíblia por essas mulheres.
Para
você entrar de cabeça nessa leitura deve se desfazer das amarras do mundo
machista em que estamos inseridas ainda hoje, após mais de 1 século depois de
sua publicação. Além disso, deve perceber nos mínimos detalhes as metáforas que
Charlotte usa para falar da opressão e da loucura em que ela se encontra. Sim,
muitos estudiosos dizem que isso tudo estava realmente acontecendo com ela. Se não
estava, buscou em alguém próximo um meio de retratar até onde a mente humana
consegue chegar. Você deve entender cada palavra aqui escrita, pois elas trazem significados inimagináveis nas entrelinhas.
Temos
aqui um conto narrado em primeira pessoa que mostra a vida de nossa
protagonista. Ela está doente, de acordo com seu marido que é médico, e, por
isso, acabam se mudando para uma outra casa, onde acaba confinada. Ao que tudo
indica, com o passar do enredo, ela está em estado depressivo, mas John, o
marido, acaba tratando tudo como um processo de histeria. Portanto o isolamento
faria bem para sua mente irrequieta. Ela não pode ter contato com outras
pessoas e qualquer mínimo esforço físico e mental lhe trariam consequências
avassaladoras, podendo ficar ainda mais doente. Mesmo escrever lhe era privado,
caso que certamente ela passou a ignorar, ainda que escondida. Essa era a única
forma que ela havia encontrado para passar os dias e até mesmo desabafar, pois
não podia confiar nas pessoas.
A
casa é grande, há muitos cômodos e uma área externa que julgava muito bonita. Mas
o marido pede que ela fique no quarto que escolhera, longe dos empregados e bem
arejado. O problema é que tudo ali a incomodava. Principalmente o papel de
parede, amarelado, repleto de fungos e com padrões de desenhos que mudam
conforme o dia passa. Nele, temos dois planos. O primeiro, com grades. O segundo,
com uma mulher (ou talvez mais, ela não sabe ao certo dizer). E é esta sua distração:
entender o porque a mulher rasteja pelo papel. E ela não quer que mais ninguém
descubra isso.
Durante
todo o início da leitura percebemos que a protagonista é totalmente submissa ao
marido, levando a crer que ele tinha outros pacientes realmente doentes para
cuidar do que deixar suas vidas de lado para seu bem-estar. Mas conforme a
narrativa vai acontecendo, observamos que aos poucos essa imagem de marido
imaculado acaba caindo por terra. Não sabemos se ela está cansada de
interpretar este papel de doente que está se recuperando (quando na verdade ela
está pior do que quando chegara), que o marido acaba acatando, ou se a
desconfiança a fez enlouquecer de vez.
Confesso
que o final acabou me surpreendendo e ele é certeiro. Não imaginava que tinha
realmente acertado, mas ao ler o epílogo pude perceber que a rota de fuga
criada por ela era tão comum antigamente quanto é ainda hoje. Como disse
anteriormente, nada aqui é o que parece e há muito mais nas entrelinhas do que
podemos imaginar. Fiquei indignada em diversas passagens, pois percebemos o
quanto o machismo esteve presente na vida das mulheres, fazendo com que suas
autonomias não existissem ou fossem praticamente nulas. Ainda hoje vemos isso,
mas é claro que com muito mais recursos que nos ajudem.
Se
você quer “sair da caixinha” e encarar uma leitura mais profunda, repleta de
reflexões, O papel de parede amarelo
é a minha indicação de hoje. Lembrando que não podemos deixar de exaltar o
trabalho gráfico da editora José Olympio, simples, mas extremamente
significativo.
O papel de parede amarelo
Autora: Charlotte
Perkins Gilman
Editora: José
Olympio
Número de páginas: 112
Onde comprá-lo: Amazon
Sinopse: Uma mulher fragilizada emocionalmente é internada, pelo próprio marido, em uma espécie de retiro terapêutico, em um quarto revestido por um obscuro e assustador papel de parede amarelo. Por anos, desde a sua publicação, o livro foi considerado um assustador conto de terror, com diversas adaptações para o cinema, a última em 2012. No entanto, devido a trajetória da autora e a novas releituras, é hoje considerado um relato pungente sobre o processo de enlouquecimento de uma mulher devido à maneira infantilizada e machista com que era tratada pela família e pela sociedade.
0 comentários:
Postar um comentário